MEMÓRIA DE UM DIA TRISTE

Levantei cedinho e já fui preparar o café. Morava na casa da sogra, mas como nunca me aceitaram plenamente como da família, (como dizem, entrei pela porta dos fundos), tratavam-me como uma funcionária. Enquanto os filhos e filhas dormiam o meu dever era cuidar da alimentação e cuidados com a casa entre outros afazeres.
Acendi o fogo no fogão de lenha, coloquei o feijão pra cozinhar, arrumei a mesa para o café rapidamente. Coloquei as roupas de molho.
Enquanto os homens que sairiam para trabalhar tomavam o café eu arrumava as camas. Apesar da barriga de 9 meses, de ter tido contratempos diários durante toda a gravidez, de pesar apenas 42 quilos, eu parecia bem disposta esse dia.
Estava feliz também, porque o marido que a muito tempo sequer olhava para mim direito resolveu ser meu motorista até o sítio da família, onde minha obrigação era colher duas bolsa de 60 quilos de milho verde para fazer pamonha e curau, alimentar e dar águas aos animais.
Contente pela companhia, fiz o trabalho com mais afinco. Entrei no milharal e quebrei o milho, carreguei as palhas que sobraram para jogar para as vacas leiteiras.
Fui até o chiqueiro dei milho aos porcos peguei dois galões de 20 litros e desci a ladeira íngreme até o riacho para buscar água para os animais, enquanto o marido fazia um check up no carro (paixão da vida dele).
Fui chamá-lo para buscar as sacas de milho verde, pois eu não aguentava carregar.
Ele estava sentado na grama ao lado do carro. Sentei-me ao lado dele tentando fazer um tipo par romântico.
Ao passo que ele me disse.
__ Isso aí na sua barriga para mim é como uma berruga! Eu não quero encostar em você enquanto você estiver com isso. Mas quando você voltar ao que era antes eu te quero de volta.
Ouvir tudo isso foi um choque. Não chorei por vergonha. Quis ser forte. Engoli a seco tudo aquilo, levantei-me, apressei-o para recolher as sacas e voltamos para a cidade.
Chegando lá a casa estava cheia. Umas visitas de passagem. Cozinhamos eu e a sogra para alimentar a todos, enquanto os de casa faziam as honras na sala eu limpava a cozinha.
O pessoal partiu logo após. A moça ao se despedir me disse que a Senhora do bom parto me acompanhasse. Nessa hora senti uma dor estranha.
Todos se foram, os que ficaram foram à sesta. Eu fui lavar roupa.
Ergui o balde no tanque, mas a dor apertou. Então larguei tudo e fui deitar. Estava com muito medo. Tinha apenas 19 anos e nenhuma explicação sobre nada.
Às 17 horas quando descobriram meu sumiço, por causa da roupa que não estava lavada, também descobriram que a hora havia chegado. As dores haviam aumentado muito.
O marido levou-me ao hospital com a mala do bebê, deixou-me na porta sem nenhuma cerimônia e foi embora sem nem um beijo de despedida.
Eu tinha de ser forte. Não havia outra opção.
Dessa vez eu não chorei!


Lunah Lan

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